segunda-feira, 6 de março de 2023

A queda de um mito

 
Quando ouço falar de reestruturações de empresas, lembro-me logo de uma empresa e de uma marca: Philips. E adianto já que não é pelas melhores razões.

É que sou de uma geração que cresceu rodeado de equipamentos que ostentavam um destes logotipos, em especial os dois primeiros, que a gigante holandesa Philips colocava nos seus produtos. Uma geração que se habituou a associar a marca Philips a inovação tecnológica e empreendedorismo, fosse na iluminação, na radiofonia, no áudio, na televisão, na electrónica de consumo, nas tecnologias de informação, nas comunicações, nos semicondutores, etc. Arrisco-me a dizer que em determinada altura não havia uma divisão das casas, um espaço dos locais de trabalho onde não fosse possível encontrar um dos logos da Philips.

Até mesmo quando na Marinha, na segunda metade da década de 1980, dei os primeiros passos no programa de aquisição das fragatas da classe Vasco da gama, lá apareceu a Philips como proprietária da solução de comando e controlo dos sistemas de combate dos navios. A Philips era omnipresente e simbolizava o sucesso empresarial nos mais variados sectores da economia mundial.

A partir da década de 1990, restruturação após restruturação, todas ela justificadas por presidentes executivos brilhantes e qualificados com os melhores MBA, a Philips foi-se desfazendo das áreas de negócio que tinham feito dela um dos mais conglomerados mundiais. A razão das reestruturações, quase sempre com o despedimento de trabalhadores, era sempre a mesma: livrar-se do que dava prejuízo para se concentrar no que, na opinião dos responsáveis, seria rentável. E assim a Philips acabou reduzida ao negócio original criado pelos seus fundadores, a iluminação, e ao dos equipamentos médicos, para tirar partido da crescente procura induzida por uma população cada vez mais envelhecida e doente.

A realidade, contudo, mostrou-se bem diferente do que os “reestruturadores” anunciaram. Várias das unidades descartadas, entres elas, por exemplo, a TSMC de Taiwan que é apenas o segundo maior produtor mundial de semicondutores, acabaram por se valorizar e obter lucros muito superiores aos da empresa mãe. E a fazer fé do relatório de resultados de 2022 (https://www.results.philips.com/), tudo leva a crer que até o negócio da saúde da Philips não tem a rentabilidade que foi anunciada em 2016.

Sem querer ser faccioso, mas não posso deixar de citar o comentário que li algures: “A Philips é um exemplo do que acontece quando se substitui engenheiros por MBA's e contadores de feijões.”

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