quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Steinbeck's Cannery Row

 


A obra "As Vinhas da Ira" (The Grapes of Wrath no original) que John Ernst Steinbeck publicou em 1939 é um retrato fiel da devastação capitalista que se apropriou do fruto do trabalho de milhares e milhares de trabalhadores rurais, rendeiros e meeiros norte-americanos e os forçou a migrar para a Califórnia, onde continuaram a ser explorados, a viver em condições sub-humanas e a ser ameaçados por grupos fascistas. Pela sua actualidade, recomendo a leitura do clássico, embora esta não seja a obra de John Steinbeck que mais me marcou.

As circunstâncias da vida fizeram com que o romance “Cannery Row” de 1945 (que na edição portuguesa recebeu o infeliz título de “Bairro da Lata”) fosse a obra de Steinbeck de que mais gostei. Muitas vezes fui conhecer lugares depois de ler as descrições feitas por escritores, mas no caso da Cannery Row em Monterey, a antiga Ocean View Avenue rebaptizada depois do sucesso do livro, aconteceu o contrário. Conheci primeiro o local e depois li o livro. E o que é certo é que, talvez por nele ter identificado imagens, pessoas, sons e cheiros que fixei numa fase muito rica da vida quando, há mais de quarenta anos, vivemos em Monterey, “Cannery Row” passou a ser um dos meus livros preferidos.

“Cannery Row” foi escrito para os jovens norte-americanos que faziam a guerra sem nunca falar dela. Fala dos habitantes de um bairro de Monterey que como o próprio Steinbeck escreveu “alguém disse serem 'prostitutas, chulos, batoteiros e filhos da mãe,' o que significava toda a gente. Tivesse espreitado por outra frincha e talvez dissesse, 'santos e anjos e mártires e homens santos,' e significaria a mesma coisa."

Mas “Cannery Row” poderia ter sido escrito sobre muitos jovens portugueses da minha geração, tivesse Steinbeck nascido noutra época e noutro continente. Poderia ter sido escrito sobre os jovens da minha geração que também fizeram a guerra e, dependendo da perspectiva, eram chulos e batoteiros, santos e mártires, filhos da mãe e homens bons, todos com histórias de sobrevivência semelhantes às das personagens de Steinbeck. Eram jovens que por educação e tal como os das gerações contemporâneas do modelo T da Ford, sabiam mais sobre a bobine e o carburador dos Mini do que sobre o clitóris ou o sistema solar.

Sem comentários:

Enviar um comentário