Hoje fui a uma escola secundária fazer uma das coisas de que mais gosto: partilhar ideias e reflexões com jovens. Desta vez contei a história d’O Cravo da Índia ou da aventura de Fernão de Magalhães, de Juan Sebastián Elcano e de muitos outros.
Falei das realizações científicas e tecnológicas portuguesas do século XV. Falei dos descobrimentos como o processo de obter o conhecimento de algo anteriormente desconhecido, de determinar a forma de vencer o medo e navegar mares que não haviam sido navegados antes e fornecer sobre eles informações náuticas precisas.
Falei da natureza laboriosa e organizada do esforço dos portugueses e das dificuldades da descoberta. Falei do modo como os marinheiros e cartógrafos portugueses alteraram a maneira de ver o mundo, de como os portugueses o reinventaram, de como imaginaram o globo de uma forma nova, a forma como o conhecemos hoje.
Falei de como a tolerância relativamente aos outros povos e religiões permitiu o maior legado dos portugueses do século XV: serem capazes de adaptar e enriquecer a herança científica helénica, islâmica e judaica para resolver os problemas da navegação no mar alto. E falei de como, depois, a intolerância da Inquisição e do Estado destruiu as conquistas de quase um século e a liderança científica e tecnológica de Portugal. Falei de como o saber acumulado, a ciência e as tecnologias que os portugueses haviam desenvolvido foram entregues de mão beijada aos navegantes espanhóis, ingleses e holandeses.
E no fim dei por mim a pensar que os navios portugueses que então sulcaram os mares não deixaram uma marca permanente na face da terra, nem mesmo os seus destroços e os mortos que jazem no fundo dos oceanos; que as medições da altura do Sol e dos outros astros não deixaram traços visíveis; que as linhas que dividiram o mundo não existem senão na nossa mente e na nossa imaginação. O ruído do vento, os sons da faina das velas, o ranger da madeira, as vozes dos homens, tudo se foi.
O imenso legado dos portugueses do século XV está hoje nas estrelas do céu e, ocasionalmente, nas embarcações que navegam cá em baixo com jovens como aqueles com quem hoje falei.
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