Facto de viver, de ter vida; existência. Experiência de vida. Processo psicológico consciente no qual o indivíduo adopta uma posição valorizante, sintética, que não é apenas passiva e emocional, pois inclui também uma participação intelectual activa. O conhecimento adquirido através da experiência vivida. Não é lido, não é contado, é experimentado.
quinta-feira, 29 de outubro de 2020
Steinbeck's Cannery Row
Uma estratégia para a indústria naval militar nacional
Há dez anos concebi uma estratégia para o sector naval militar e com o Fernando Ribeiro e Castro, tentámos motivar as empresas associadas do Fórum Empresarial da Economia do Mar, sem qualquer resultado.
Esta foi a nossa proposta.
No quadro da
globalização competitiva, a Economia do Mar é um componente essencial da
estratégia de desenvolvimento de Portugal. De acordo com o Relatório Final daSaeR/ACL de 17 de Fevereiro de 2009, o
Hypercluster da Economia do Mar é um
dos cinco domínios estratégicos mais promissores, a par do Turismo, do Ambiente,
dos Serviços de Valor Acrescentado e da Organização de Espaços Urbanos.
O Hypercluster da Economia do Mar é aqui entendido como o conjunto de
clusters ou componentes estratégicos
que, não tendo necessariamente entre si relações de intercâmbio económico ou
tecnológico estreitas, existem em torno da exploração de um mesmo recurso ou de
um mesmo património de grande dimensão e que suporta uma grande variedade de
funções. Os componentes estratégicos deste Hypercluster
correspondem às actividades económicas ligadas ao mar (Visibilidade,
Comunicação, Imagem e Cultura Marítimas; Náutica de Recreio e Turismo Náutico;
Transportes Marítimos, Portos e Logística; Construção e Reparação Navais;
Pesca, Aquicultura e Indústria de Pescado; Energia, Minerais e Biotecnologia;
Obras Marítimas; e Serviços Marítimos) e as necessárias actividades
transversais de base ou suporte (Produção de Pensamento Estratégico; Ambiente e
Conservação da Natureza; Defesa e Segurança no Mar; Investigação Científica,
Desenvolvimento e Inovação; e Ensino e Formação).
Dada a natureza e a estrutura
do Hypercluster da Economia do Mar, afigura-se
que a realização do objectivo estratégico de salvaguarda dos recursos marítimos
nacionais requer uma abordagem holística dos componentes Defesa e Segurança no
Mar, Construção e Reparação Navais e Serviços Marítimos e das suas relações.
As funções de Defesa e
Segurança no mar são funções em larga medida da responsabilidade do Estado e
são essenciais ao funcionamento do Hypercluster.
Em Portugal e para além das missões de combate e de projecção de força, existe uma
longa experiência de atribuir à Marinha militar missões de serviço público de
tempo de paz, sendo que as de segurança são essencialmente executadas com meios
navais militares.
Assim, a
auto-suficiência da Defesa e Segurança dos recursos marítimos nacionais só será
assegurada se a Indústria portuguesa tiver capacidade de manter, modificar,
modernizar e reparar os nossos meios navais militares. Por outro lado, as
infra-estruturas, equipamentos e competências para construir novos navios
militares de dimensão adequada para o exercício das actividades de fiscalização
e segurança marítimas podem também ser activos importantes e duradouros naquele
contexto.
Neste contexto afigura-se
adequado reflectir sobre as condições actuais da construção e reparação dos
meios navais militares em Portugal.
A Construção e a Reparação Naval Militar
A construção e a
reparação de navios são actividades económicas distintas que não concorrem
entre si e raramente cooperam, chegando a afirmar-se que só têm a doca em comum.
A primeira é capital intensiva e em regra subsidiada, a segunda é mão-de-obra
intensiva e actua num mercado muito exigente e dinâmico, ambas têm requisitos
de engenharia e tecnologia muito diferenciados.
Tabela 1 –
Construção naval militar e comercial - Comparação
|
Militar |
Comercial |
Quanto aos Processos de Negócio |
||
Mercado |
Monopsônio, com a procura totalmente controlada pelo
Estado através da Defesa Nacional |
Aberto e global, com mecanismos de oferta e procura
dependentes dos armadores e operadores comerciais, estaleiros e fabricantes
de equipamentos |
Contratação |
Demorada, com formação de parcerias limitadas de
fornecedores em função das condições específicas e grande envolvimento de
recursos, sujeita a regras administrativas complexas mas tolerantes às
variações de prazos e preços induzidas pelas alterações de requisitos durante
a construção |
Rápida, simples, regulada pelos mecanismos da oferta e
procura e da competição entre múltiplos fornecedores, com formação de preços
fixos e margens reduzidas para alterações ou revisões de preços |
Gestão de projecto |
Complexo |
Simples |
Construção |
Soluções delicadas (ex. chapa fina, espaços reduzidos),
maior duração (cerca de 4 vezes mais) e controlo de qualidade mais oneroso |
Fortemente capital intensiva, com requisitos de
produção quantitativa e qualitativamente pouco exigentes |
Recursos humanos |
Fortemente trabalho intensivo, rácio entre pessoal de
colarinho branco e azul de 1:1,7, 30% do esforço aplicado nas estruturas do
navio |
Rácio entre pessoal de colarinho branco e azul de 1:6,
50% do esforço aplicado nas estruturas do navio |
Quanto ao Produto |
||
Dimensão e complexidade dos navios |
Compactos e complexos |
Grandes e, normalmente, simples |
Definição e estabilização de requisitos técnicos e
funcionais |
Muito demoradas, com intervenção de múltiplas entidades
e especialistas |
Rápida e simples, com poucos intervenientes
multidisciplinares e condicionada pelas regras padronizadas das sociedades
classificadoras |
Projecto |
Duração média superior a 2 anos, com grande interacção
com diversos intervenientes, conformidade com normas muito diversas,
exigentes e em constante evolução, sistemas de combate e segurança complexos,
novos desenvolvimentos frequentes e suportados pelo armador, esforço muito
significativo de produção e gestão de documentação técnica |
Duração média de 6 meses, com interacção com um número
muito reduzido de intervenientes, conformidade com normas simples e estáveis,
replicação de soluções comuns a muitos navios e patrocinadas pelos
fornecedores dos sistemas e equipamentos, consagradas contratualmente e com
inovações reduzidas ou nulas por conta do construtor |
Equipamentos |
Características funcionais e ambientais específicas,
sendo críticas no caso das armas e sensores |
Características técnicas e funcionais padronizados e
comuns a múltiplos fornecedores |
Provas |
Extensão e profundidade das provas de aceitação
maximizadas, com intervenção de diversos intervenientes e de acordo com
regras muito exigentes |
Extensão e profundidade limitadas e complementadas
pelos testes funcionais em serviço |
Sendo certo que a
diferenciação é quase absoluta para os navios comerciais, também é verdade que
a construção e a reparação são cada vez mais encaradas como componentes
importantes e complementares das políticas nacionais de sustentação dos meios
navais militares e de optimização da Defesa e Segurança no mar. Quando
exercidas no contexto restrito do ciclo de vida dos navios militares, estão
interligadas e contribuem, de acordo com a dimensão do país e a consequente
importância relativa de cada uma, para a sustentação de um sector estratégico
com características muito particulares e que enfrenta hoje importantes
desafios. É assim apropriado abordar a estratégia para o sector de construção e
reparação naval militar nacional de forma integrada, à semelhança do que se faz
nos países com clusters
marítimos importantes.
Por outro lado, o
sector de construção e reparação naval militar também se diferencia do sector
de construção e reparação naval comercial. Enunciam-se na Tabela 1 as principais diferenças entre construção naval militar
e comercial, sendo que uma comparação semelhante para a reparação tem
resultados análogos. As Indústrias Navais militar e comercial são de facto duas
realidades distintas que raramente coexistem, mesmo quando estaleiros militares
e comerciais são geridos pelo mesmo grupo (ex. Damen Group na Holanda) ou
quando o mesmo estaleiro realiza construções militares e comerciais (ex. HDW do
ThyssenKrupp alemão). No mundo anglo-saxónico estas realidades são clara e
inequivocamente diferenciadas nas suas designações correntes: naval shipbuilding para a militar e commercial shipbuilding para a
comercial. Neste contexto é aconselhável grande prudência na aplicação de
soluções do sector comercial ao militar e vice-versa.
A Situação
Internacional
Ao analisarmos as
principais economias ocidentais com interesses no mar e nas actividades
marítimas - Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Itália,
Holanda, Espanha, Noruega -, verifica-se que o sector de construção e reparação
naval militar é fortemente, senão mesmo totalmente, condicionado pelas
políticas de Defesa e Segurança dos respectivos Estados. É aliás esta a razão
da natureza monopsonista deste sector nos países onde tem alguma relevância. O
domínio da Defesa Nacional como o único comprador em cada um dos países e os
mecanismos de protecção interna associados conferem características únicas a
este sector.
Sem qualquer excepção, os planos estratégicos definidos para
o sector de construção e reparação naval militar de cada um dos países
observados têm como principais objectivos:
- Manter em cada
país as capacidades e competências estrategicamente importantes, de acordo
com a política de Defesa do Governo e os requisitos operacionais e as
necessidades da Marinha militar;
- Definir o
relacionamento entre a Defesa Nacional e a Indústria, nacional e
estrangeira, mais apropriado para o desenvolvimento e entrega oportuna,
dentro do orçamento e conforme as especificações de desempenho, dos meios
navais requeridos pala Marinha militar;
- Assegurar o acesso
às tecnologias que desenvolvam e fortaleçam a independência do sector
tecnológico e industrial nacional;
- Propiciar ao
Governo o melhor retorno de longo prazo para cada investimento de
aquisição e de apoio ao ciclo de vida dos meios navais, num contexto
industrial viável, internacionalmente competitivo, eficiente e fiável;
- Propiciar à
Indústria certezas e orientações de planeamento sobre necessidades previsíveis
da Marinha de modo a que as construções e reparações sejam geridas e
executadas por um sector de construção e reparação naval sustentável e
eficiente;
- Assegurar condições
para investimentos de longo prazo em I&D e formação.
Os mesmos planos estratégicos preocupam-se sempre com os três
elementos nucleares para o sector:
- Pessoas com
conhecimentos e competências especializados para construir e manter os
meios navais da Marinha militar;
- Infra-estruturas singulares
pela sua natureza especializada ou proximidade geográfica das bases navais
e pontos de apoio,
- Tecnologia
relevante e respectiva propriedade intelectual.
Nos países onde a
Defesa Nacional mantém um relacionamento sustentável com um sector de
construção e reparação naval militar consolidado, a abordagem à concretização
daqueles planos estratégicos é muito semelhante, apenas diferindo em aspectos de
pormenor resultantes dos condicionalismos nacionais particulares.
As competências que todos procuram preservar nos
respectivos sectores de construção e reparação naval militar são de dois
grandes tipos:
- Actividades de
engenharia naval militar de topo tais como engenharia de sistemas,
projecto detalhado, gestão de programas e projectos complexos, e
integração de sistemas e da plataforma;
- Actividades de
produção tais como construção, aprestamento e instalação de equipamentos.
As competências
associadas às primeiras são específicas da construção e reparação naval
militar, têm um valor estratégico elevado e são detidas por um número muito
restrito de organizações ou empresas nacionais. As competências de produção são
igualmente importantes para o sector mas podem ser encontradas com facilidade
fora dele, em especial no sector de construção e reparação comercial. É
preocupação essencial dos responsáveis pelas políticas de Defesa manter ambos
os conjuntos de competências alinhados de modo a mitigar os riscos inerentes
aos principais programas navais militares, tanto de construção de navios como
de manutenção da esquadra.
Quanto ao modelo estrutural adequado para o sector de
construção e reparação naval militar, os vários países realizaram estudos
extensos e profundos durante as últimas décadas e os de média e pequena
dimensão chegaram, sem excepção, a duas conclusões centrais:
- A procura em cada
país só permite sustentar uma única entidade construtora e reparadora de
meios navais militares especializada, independentemente da dispersão ou variedade
dos meios técnicos e fabris orgânicos que coordene;
- O paradigma de uma
entidade singular responsável pela construção e reparação dos meios navais
militares (ECRN) e operando em regime de ajuste directo (sole source arrangement) gerido
conjuntamente com os Ministérios da Defesa como clientes, afigura-se como
o único viável para responder às necessidades das respectivas Marinhas
militares nacionais.
A existência de uma
entidade empresarial nacional e autónoma responsável pela construção e
reparação naval militar e reconhecida como aliado e interlocutor privilegiado
da Defesa, a ECRN, tem como objectivo, de entre outros, resolver as disfunções
e assimetrias de um mercado onde os Ministérios da Defesa e/ou as Marinhas
militares nacionais são o único comprador em cada país. A natureza peculiar e
assimétrica do sector e a adopção de modelos e práticas de contratação e
supervisão generalistas mas pouco adequados, têm efeitos perversos que se procura
minorar ou eliminar com esta abordagem. Com frequência, a relação entre os
representantes da Defesa Nacional e os múltiplos fornecedores, com capacidades
e dimensões muito díspares, está na origem de situações lesivas dos interesses
dos Estados e que oscilam entre a prepotência ou desincentivo relativamente aos
pequenos e médios fornecedores nacionais e a submissão, consciente ou não, aos interesses
dos grandes fabricantes internacionais.
Assim e em consequência
da aplicação daquelas conclusões nos países com um sector de construção e
reparação naval militar relevante, assistiu-se à consolidação dos
correspondentes meios de engenharia e fabris, com a formação de entidades
empresariais públicas ou privadas que, isoladamente ou em cooperação com
organismos fabris estatais, asseguram integralmente a execução dos programas
definidos pelos governos para o sector. Cita-se a BAE Systems no Reino Unido, a
DCNS e Thales em França, a Navantia em Espanha, o ThyssenKrupp na Alemanha ou o
Damen Group na Holanda.
Por outro lado e com
pequenas variações, os diversos países têm vindo a adoptar o mesmo modelo de
relacionamento entre a Defesa Nacional e as ECRN. A Figura 1 esquematiza esse modelo comum de relacionamento,
ressalvando-se as diferenças de implementação nos diversos países.
Em termos muito gerais, o quadro de referência das
relações entre os intervenientes na construção e reparação naval militar em
países onde foi instituído o princípio da ECRN é construído com base em
parcerias ou alianças de configuração e duração variável e distribuídas por
três níveis distintos de decisão e execução:
- Liderança
estratégica
- Alianças de
Capacidades
- Agrupamentos de
Subcontratantes.
As parcerias ou
alianças nos diferentes níveis, incluindo o de Liderança estratégica, são
definidas caso a caso (programa a programa ou projecto a projecto) de acordo
com regras contratuais e parâmetros de avaliação de desempenho bem definidos.
A Liderança Estratégica
é o corpo director do quadro de referência para todos os intervenientes e
estabelece o “porquê” e o “quê” das actividades relevantes de construção e
reparação naval militar. Constitui-se por relação contratual de parceria entre
a Defesa e a ECRN em função dos programas navais militares decididos pelo
Governo. Superintende a gestão de cada um dos programas de construção e
reparação executados pelo sector e, mais importante, assegura a manutenção e
sustentação das capacidades e competências estratégicas do sector de construção
e reparação naval militar nacional.
As Alianças de
Capacidades são os diversos agrupamentos ou consórcios do nível intermédio que
contam sempre com a participação da Defesa e da ECRN. Se bem que de natureza
diferente conforme se trate do apoio na fase operacional ou de um projecto de
construção ou aquisição, em ambos os casos asseguram o fornecimento de meios ou
capacidades. Neste nível e para cada projecto concreto, as relações de parceria
com as empresas nacionais e estrangeiras assumem grande relevância e não devem
ser confundidas com as relações complementares de subcontratação.
Em todos os países
observados a implementação deste modelo está relativamente consolidada e
estável e assegura em cada um deles a integração vertical e a protecção das respectivas
competências e capacidades estratégicas. As participações cruzadas entre os países
que adoptaram o modelo é normalmente feita no nível inferior de Agrupamentos de
Subcontratantes, dado que os dois níveis superiores estão em regra blindados
aos actores estrangeiros. A participação da Thales no nível intermédio do
programa CVF inglês é uma interessante excepção à regra.
A projecção de cada um
desses países no mercado militar internacional é feita com o apoio do
respectivo ministério da Defesa, no âmbito da Liderança Estratégica, oferecendo
soluções que replicam as que desenvolveram de acordo com o quadro estratégico
de referência interno. Desta forma rentabilizam os investimentos internos e
asseguram a subsistência das empresas nacionais do sector. Os alvos são
geralmente os países que não possuem um sector de construção e reparação naval
militar ou que, possuindo-o, não têm um quadro estratégico de referência que o
proteja. Países como o Brasil até muito recentemente, a Indonésia, a Malásia ou
Portugal são territórios privilegiados para esse tipo de acções comerciais, normalmente
sob a forma de financiamento de novas construções ou transferência de meios
navais, de participação em grupos de utilizadores desses meios, de oferta de
‘soluções acabadas e testadas’ a preços baixos, de consultoria em áreas
estratégicas como o projecto preliminar e detalhado, a gestão de programas, o procurement ou o apoio logístico
integrado. Esta política comercial agressiva dos grandes grupos internacionais
resolve os problemas imediatos mas acaba por resultar a prazo no definhamento dos
sectores de construção e reparação naval militar dos países alvos e na dependência
e submissão a interesses externos.
Vale a pena analisar o
caso da Austrália e da Nova Zelândia. Apesar das dificuldades no
estabelecimento de um plano estratégico para o sector de construção e reparação
naval militar, têm gerido de forma inteligente e equilibrada o relacionamento
com grandes grupos industriais dos Estados Unidos, do Reino Unido, da França e da
Alemanha, estabelecendo regras de actuação e reforçando o seu sector de
construção e reparação naval militar. As orientações para a reorganização da Indústria
nacional de material de Defesa definidas na recente Estratégia Nacional de
Defesa do Brasil são também um caso interessante de estudo. A transferência de
tecnologia passou a ser um dos pontos fundamentais da política brasileira de Defesa,
sendo um factor decisivo para a aquisição de equipamentos militares. Mesmo que
um determinado equipamento tenha um preço mais elevado ou características funcionais
e tecnológicas inferiores ao similar estrangeiro e acabado, dá-se preferência se
for nacional ou se forem criadas condições para desenvolvê-lo no país e
elevá-lo aos padrões internacionais.
A Situação Nacional
Na ausência de um
quadro de referência estratégico para o sector de construção e reparação naval
militar nacional, parece razoável utilizar o modelo descrito anteriormente para
caracterizar a situação do sector em Portugal.
Desde logo verifica-se
que não existe uma entidade comparável à ECRN, com responsabilidade de direcção
técnica e coordenação superior ao longo de todo o ciclo de vida dos meios
navais. Nos programas de aquisição e construção as suas funções são parcial e
casuisticamente desempenhadas pelo Ministério da Defesa Nacional (MDN) com
assessoria da Marinha, verificando-se ainda nos programas executados em
Portugal a intervenção do Estado através dos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo. A reparação dos meios navais tem sido da responsabilidade exclusiva da
Marinha e a sua execução orgânica relaciona-se marginalmente com a política e os
programas de aquisição e construção.
Os representantes do
Estado acabam por, na maior parte dos casos, intervir nos níveis intermédio e
inferior, envolvendo-se com frequência nos processos de subcontratação e de
execução e avaliação de desempenho dos subcontratantes. Sem o enquadramento
estratégico de modernização do cluster
marítimo nacional nem a definição da política de alianças de capacidades mais
adequada, os representantes do Estados limitam-se a aplicar casuisticamente as
regras gerais da contratação de bens e serviços. A aplicação transversal e
uniforme dessas regras num quadro de globalização competitiva de um sector
peculiar e assimétrico acaba por desincentivar os actores nacionais e favorecer
os grandes fabricantes internacionais.
A simples selecção ou
decisão de aquisição de um equipamento ou até mesmo de um sistema para um navio
da Marinha pode ter implicações sistémicas que vão muito para além das
considerações técnicas e económicas típicas de um processo isolado de
contratação de bens e serviços. Este é um factor crítico do sucesso ou fracasso
das estratégias de modernização, fortalecimento e projecção das empresas nacionais
do sector.
Acresce que o vazio
deixado pela inexistência de uma ECRN na gestão e execução dos programas é em
regra preenchido pela Marinha ou pelos estaleiros construtores, numa situação de
risco acrescido. Em programas de construção naval militar não é sensato conferir
aos estaleiros protagonismo em níveis de decisão e execução acima do adequado
(3º nível de do modelo de referência, Agrupamentos de Subcontratantes). A
estabilização dos requisitos operacionais, a elaboração e discussão do projecto
preliminar, a gestão de riscos do programa ou o enquadramento da construção no
ciclo de vida dos meios navais são elementos estranhos à actividade regular dos
estaleiros, sejam eles de construção naval militar ou comercial.
No caso de estaleiros
de construção naval comercial, o risco é ainda maior porque a cultura, as competências
e as capacidades próprias não estão alinhadas com as da construção naval
militar. De entre outros, a natureza e a dinâmica da especificação de
requisitos do projecto de um navio militar ou a particularidade do
relacionamento com o armador militar ou com os fornecedores críticos para o
sucesso do programa são elementos estranhos à realidade dos estaleiros de construção
naval comercial.
Programas de construção
recentes demonstraram as deficiências do modelo centrado nas abordagens
tradicionais de um estaleiro de construção naval comercial. No momento em que
se procuram alternativas e sendo certo que os principais actores dos diferentes
complexos industriais navais militares europeus têm uma capacidade muito grande
de perceber as nossas dificuldades assim com as nossas fraquezas e
vulnerabilidades estruturais, torna-se-lhes fácil apresentar soluções atraentes
e expeditas, verdadeiros cantos de sereia para os responsáveis por um sector em
crise profunda. É necessário estar atento e acautelar os potenciais efeitos
negativos das propostas dos grandes grupos europeus do sector.
A reparação naval
militar, que no caso português é a actividade do sector com maior relevância
para a Indústria nacional, tem sido exclusivamente gerida pela Marinha e, tal
como a construção, é estranha a uma política integrada para o sector. É no
entanto consensual que o Arsenal do Alfeite é o elemento fundamental de uma estratégia
eficaz de sustentação e modernização dos meios navais militares. Actualmente é uma
actividade cujos processos tecnológicos apresentam índices de desempenho
razoáveis mas com carências e disfunções no que se refere à gestão de projecto
e à cadeia logística (supply chain). A
recente empresarialização do AA pode permitir a correcção das disfunções assim
como a qualificação e expansão da actividade de reparação naval militar.
É um lugar-comum
dizer-se que as crises podem revelar-se como oportunidades. No caso do sector
de construção e reparação naval militar nacional a crise actual pode ser uma
oportunidade, embora muito estreita, de regeneração e fortalecimento. Existem condições
objectivas, grande parte na esfera de acção da Estado e das empresas com
interesse no sector, para se definir um quadro estratégico de referência e
gerir correcta e adequadamente o relacionamento com os potenciais parceiros
internacionais, com o objectivo de se evitar o provável colapso, reconstruir as
capacidades nacionais e projectá-las nos nossos mercados naturais de expansão.
As Empresas do Sector Naval Militar
Nacional
Em países com a
dimensão de Portugal, a sustentação de empresas nacionais com competências e
capacidades específicas das áreas da Defesa e Segurança no mar e da construção
e reparação naval militar, só se afigura viável se, no quadro estratégico de
referência definido para cluster
marítimo nacional, houver estabilidade e continuidade na utilização dessas
capacidades.
As diferenças
significativas entre os sectores militar e comercial reflectem-se não só nos
estaleiros navais mas também nas empresas de suporte, fornecedoras de bens e
serviços ou outras. As empresas tecnológicas especializadas em soluções para o sector
naval militar são em regra distintas e em número muito reduzido quando
comparadas com as do sector naval comercial. A utilização de algumas
tecnologias e soluções por ambos os sectores (dual use) permite atenuar alguns dos efeitos das diferenças entre
os dois contextos sem contudo os eliminar.
Na generalidade dos
países, os investimentos em programas nacionais integrados de construção e reparação
naval militar são rentabilizados através da projecção no mercado externo das
soluções e dos produtos desenvolvidos pelos núcleos de especialização
nacionais. As parcerias internacionais são cada vez mais utilizadas como
instrumento de fortalecimento da capacidade tecnológica nacional e de redução
da dependência externa que é característica dos países compradores de serviços
e produtos acabados. Neste contexto as experiências nacionais são incentivadas
pelo Estado e os casos de sucesso são escrutinados e aproveitados como
instrumentos da política económica externa.
Mas se a demonstração
da operacionalidade e robustez das soluções desenvolvidas para programas
nacionais é uma condição necessária para que venham a ser consideradas pelos
potenciais clientes internacionais, não é contudo suficiente para assegurar a
sua adopção por esses clientes. A promoção no mercado externo requer também uma
política comercial agressiva de parcerias e de acordos que assegure a entrada
em áreas de influência dos grandes fornecedores internacionais. No caso de
países como Portugal, as parcerias e os acordos são fundamentais para
viabilizar a abertura ou expansão de mercados, com o consequente aumento das
exportações de marcas e produtos nacionais para mercados de Defesa e Segurança dominados
ou influenciados pelos principais países vendedores.
Os programas de
apetrechamento naval, novas construções, aquisições ou modernizações, são
oportunidades de consolidação e fortalecimento das competências nacionais nas
duas vertentes principais: maximização da participação nacional nas soluções
seleccionadas e criação de parcerias para o mercado internacional. Em concreto,
ao acordar programas de apetrechamento naval com outros países, afigura‑se necessário
que Portugal dê preferência à solução x do fabricante y do país z, desde que,
em regime de acordo de negócio ou parceria (business
agreement) e não de contrapartida, o país z também dê preferência ao
sistemas ou produtos nacionais ou o fabricante y incorpore os produtos e
serviços das empresas nacionais na solução x ou noutras e os promova nos seus
projectos em mercados internacionais.
Mas quais serão as soluções
e serviços oferecidos pelos núcleos de especialização nacionais que interessa
fortalecer, projectar e replicar no mercado global? A resposta a esta questão
requer uma análise detalhada e rigorosa do mercado global que ultrapassa o
âmbito deste apontamento mas é possível identificar algumas áreas onde essas
soluções de complementaridade podem ser definidas.
Desde logo e por ser
mais óbvio, as áreas de aplicação directa das tecnologias na construção e
reparação de navios e dos seus sistemas e equipamentos, especialmente dos
utilizados nas funções de vigilância, comando e controle, comunicações e de
gestão de informação. Tratando-se de um mercado saturado e muito competitivo e
sem prejuízo da avaliação que as empresas nacionais terão necessariamente de
fazer das reais oportunidades de negócio, isoladamente ou em parcerias,
afigura-se que as soluções que requeiram a integração de sistemas são as que em
princípio oferecem melhores condições de sucesso.
Existem, no entanto, outros produtos e serviços que as empresas do sector de construção e reparação
naval militar nacional podem oferecer com impacto sistémico em todo o cluster marítimo nacional. Estão nessa
condição os produtos e serviços associados à criação e manutenção das condições
de sustentabilidade dos meios navais (lifetime
supportability) que com alguma facilidade podem ser replicados ou estendidos
a outros componentes estratégicos do Hypercluster
do Mar, nomeadamente aos Serviços Marítimos de gestão de frotas, à Náutica de
Recreio e Turismo Náutico, aos Portos, Logística e Transportes Marítimos e ao
Ambiente e Conservação da Natureza.
Admitindo condições
ideais de sustentabilidade dos meios navais militares nacionais e à semelhança
do que fazem os países preocupados com a redução dos custos de aquisição e
manutenção do seu dispositivo de Defesa, o MDN define um plano estratégico para
o sector de construção e reparação naval militar e estabelece as regras do
sistema de aquisição e manutenção dos meios militares em coerência com aquele
plano estratégico. Nesse contexto, o MDN ou um corpo técnico e de engenharia na
sua dependência, estabelece políticas de gestão do material, alinhadas com os
modernos padrões científicos, tecnológicos e económicos.
No caso da manutenção
dos meios militares e para além de outras abordagens facilitadoras e de
controlo como a melhoria contínua de processos (CPI) e a logística centrada no
desempenho (PBL), é hoje universalmente aceite que a estratégia de
sustentabilidade de todo o ciclo de vida dos sistemas dos navios se construa a
partir do que se designa por “Condition
Based Maintenance Plus” (CBM+). A estratégia CBM+
procura optimizar os indicadores de desempenho que caracterizam a prontidão do
material: disponibilidade, fiabilidade, tempo de paragem e custos de
propriedade. A estratégia CBM+ expande os tradicionais processos de
manutenção baseados na avaliação em tempo real da condição dos sistemas a
partir de sensores embebidos ou de testes externos, e na execução da manutenção
perante a evidência da sua necessidade. A estratégia CBM+ utiliza
uma abordagem de engenharia de sistemas para recolher dados, analisá-los e
sustentar os processos de decisão para aquisição, sustentação e operação dos
sistemas de Defesa e Segurança. Os conceitos de sistemas de gestão da
manutenção automatizados (CMMS) e de apoio logístico integrado (ILS) dos anos
80, da manutenção centrada na fiabilidade (RCM) e da manutenção por
acompanhamento de condição (CBM) dos anos 90, deram lugar neste milénio às
abordagens de prognostic and health
management (PHM) e mais recentemente CBM+, com integração de
disciplinas de engenharia, de gestão e de apoio à decisão até hoje estranhas à
actividade de manutenção.
A adopção de
estratégias CBM+ leva à criação sistemas de sustentação
multidisciplinares ajustados às condições locais, com incorporação de
capacidades orgânicas na dependência da Defesa Nacional e da Indústria privada,
com a presença de diversas tecnologias, processos e metodologias,
designadamente e de entre outros, diagnóstico e prognóstico, informação
distribuída, treino interactivo, fusão de dados, sistemas de informação
integrados de apoio à decisão, identificação e localização automática de
material e activos, reconhecimento de imagem e som, sistemas cognitivos, sistemas
de comunicações, etc.
A construção e a manutenção
de um sistema de sustentação robusto e completo como o que atrás se
caracterizou requerem assim um esforço de coordenação e de integração de
sistemas que não se compadece com a aplicação fragmentada das regras gerais de
contratação de bens e serviços.
Num exercício que pode
ser facilmente estendido a outras áreas tecnológicas do sistema de sustentação
dos meios militares navais, valerá a pena analisar o caso do sistema de gestão
da plataforma, uma das principais fontes de dados para o acompanhamento de
condição e a gestão da manutenção. É sabido que o mercado de automação naval
está reduzido a 4 ou 5 fornecedores mundiais. Assumindo-se que as
características funcionais e físicas das soluções oferecidas são semelhantes,
que critérios de selecção, para além do preço, devem ser considerados em cada
novo projecto de construção ou modernização?
Na perspectiva da
estratégia CBM+, a adopção de protocolos abertos que permitam a
sustentação do hardware e software do sistema de automação por
empresas nacionais e a ligação a sistema de diagnóstico e prognóstico é desde
logo essencial. Complementarmente os fabricantes que proporcionarem
oportunidades de parcerias comerciais para exportação da solução nacional de CBM+
são em princípio preferenciais. Do ponto de vista do interesse nacional, os
fornecedores que oferecerem a promoção e venda da solução de PHM eventualmente
desenvolvida em Portugal no âmbito de um projecto de I&D deveriam também
ser privilegiados. Finalmente, se o diagnóstico e a avaliação de condição forem
associados a um software de gestão de
manutenção ou, em âmbito ainda mais alargado, de gestão do ciclo de vida dos
sistemas e equipamentos certificado por sociedades classificadoras, o papel das
tecnológicas nacionais pode ganhar uma dimensão muito interessante, com óbvias
e rentáveis aplicações no sector marítimo comercial.
Neste contexto, a
selecção de um fabricante de automação naval num programa de apetrechamento
naval, seja ele de construção ou modernização, adquire uma importância que ultrapassa
a mera avaliação técnica e financeira de propostas de fornecimento do sistema
de gestão da plataforma. Sendo certo que todos os fornecedores mundiais de automação
naval reclamam que têm soluções acabadas e completas prontas a fornecer a
preços competitivos e que os sistemas integrados de um único fabricante têm
vantagens para o utilizador final, cabe aos responsáveis pela construção e
reparação naval militar do país comprador alinhar as considerações comerciais
com os imperativos estratégicos e dar prioridade ao desenvolvimento de
capacidades tecnológicas nacionais que assegurem e optimizem a sustentabilidade
dos meios navais afectados pela decisão final.
Dentro de uma política
de apoio e manutenção que minimize o custo total do ciclo de vida dos navios e que
rentabilize e procure o retorno do investimento inicial, o sistema de gestão da
plataforma de cada navio é uma das peças fundamentais para a gestão da infra-estrutura
de informação de apoio à decisão. Fora deste contexto, a selecção da automação é
determinada por considerações técnicas e financeiras associadas ao comando e
controle dos sistemas. Em regra privilegia-se a unicidade, normalmente
associada à rigidez da solução ou a custos elevados de adaptação, e secundariza-se
compatibilidade, factor facilitador da integração e do retorno económico do
investimento inicial.
Conclusão
Afigura-se desejável
que o sector da construção e reparação naval militar abandone o modelo baseado
na dependência tecnológica externa com o consequente impacto negativo na
Economia Portuguesa e se constitua como um componente estratégico essencial do Hypercluster da Economia do Mar
nacional. Nesse contexto é aconselhável que a regeneração e consolidação do
sector de construção e reparação naval militar nacional procure subir na cadeia
de valor, de acordo com o modelo adoptado pelos países com interesses no mar e
nas actividades marítimas e onde a Defesa mantém um relacionamento sustentável
com um sector de construção e reparação naval militar consolidado.
O sector naval militar,
à semelhança de todo o cluster
marítimo nacional, tem exigências holísticas que tornam irrelevantes as actuações
fragmentadas. Tem também potencial sinergético ao nível das empresas porque,
ultrapassada a visão fragmentária ineficaz, a actuação sistémica revelará e
potenciará as forças internas agregadoras e empenhadas no desenvolvimento e
consolidação do sector.
O Estado, que não tem
condições objectivas para satisfazer as exigências de todos os níveis de actuação,
deveria deixar para as empresas a definição das alianças de capacidades e dos
agrupamentos de fornecedores mais adequados para se atingirem os objectivos
estratégicos por ele definidos.
A criação de uma
entidade empresarial nacional e autónoma responsável pela construção e
reparação naval militar e reconhecida como aliado e interlocutor privilegiado do
Ministério da Defesa Nacional, pode resolver as disfunções e assimetrias actuais.
A relação estreita entre a Defesa Nacional e essa entidade empresarial nos dois
níveis superiores de decisão e execução (Liderança estratégica e de Alianças de
Capacidades) pode criar condições para uma política de construção, aquisição, apoio
e manutenção que minimize o custo total do ciclo de vida dos meios navais
empenhados na Defesa e Segurança no Mar.
A propriedade, o
governo e organização operacional dessa entidade empresarial são factores chave
para o seu sucesso e é necessário definir com clareza os princípios
orientadores essenciais.
Quanto à propriedade,
deve ser maioritariamente nacional, e há vantagens na diversidade para evitar o
controlo por qualquer grupo de interesses. O Estado, através da Defesa Nacional
ou de qualquer outra entidade estatal, não deve ter o controlo maioritário do
capital. Deve no entanto aprovar as emissões ou transferências de participações
ou acções de modo a assegurar, entre outros objectivos, que as alterações de
propriedade não prejudicam o acesso às tecnologias e aos conhecimentos
estratégicos. A organização operacional deve ser autónoma, tendo a Defesa Nacional
visibilidade da gestão e desempenho da nova entidade empresarial sem interferir
nas suas actividades operacionais. A implementação destes princípios deve ser
simples e os mecanismos reguladores da nova entidade empresarial devem ser
claros e transparentes, eventualmente consagrados no regime contratual
estabelecido com a Defesa Nacional nos diversos níveis de actuação.
No quadro preconizado
para o sector de construção e reparação naval militar, onde a entidade
empresarial nacional e autónoma terá um papel agregador e catalisador das
capacidades da Indústria, devem ser definidas quais as soluções e serviços
oferecidos pelos núcleos de competência nacionais que interessa fortalecer e
projectar no mercado global, assim como a forma de o fazer.
Numa visão holística, o contributo das empresas nacionais actualmente participadas pelo Estado será fundamental para a rentabilização da construção e reparação dos meios navais militares essenciais para a Defesa e Segurança no Mar e um factor crítico de sucesso do Hypercluster do Mar nacional, em especial devido à sua experiência, às suas competências e às suas soluções em áreas muito diversas. Mas nesta mesma visão, a participação qualificada do sector privado nos programas de construção, aquisição, manutenção e modernização de meios navais nacionais, com soluções passíveis de serem replicadas e projectadas no mercado global, em parcerias nacionais e internacionais, é condição necessária para consolidar e rentabilizar o trinómio Defesa e Segurança no Mar, Construção e Reparação Navais e Serviços Marítimos, e contribuir positivamente para a Economia Portuguesa.