A Maria João entrou no meu gabinete e disse-me:
- Sabe que um avião chocou com uma torre em Nova Iorque?
Fiquei surpreendido, mas não dei muita atenção, tinha de me despachar para ir buscar o meu tio ao São José. No trajecto fui ouvindo a TSF e percebi que a coisa estava complicada.
Soube nos dias seguintes que o atentado causara cerca de três mil mortos e que era obra de uma organização fundamentalista islâmica fundada pelo milionário saudita Osama bin Laden, sem, no entanto, perceber o seu impacto no futuro do mundo.
Só um mês depois, com a invasão do Afeganistão para alegadamente encontrar Osama bin Laden e outros líderes da Al-Qaeda, destruir a organização e remover do poder o regime talibã, comecei a perceber a dimensão e a natureza do problema.
E melhor percebi quando em Março de 2003, contra a opinião pública mundial e os milhões de cidadãos que se manifestaram na rua em centenas de cidades de todo o mundo, os EUA, com o apoio militar do Reino Unido, da Austrália e da Polónia, e o apoio político de governos como o de Portugal e o de Espanha, invadiram o Iraque, alegadamente para desarmar todo o seu arsenal nuclear, químico e biológico, e derrubar o regime de Saddam Hussein, que apoiaria e financiaria grupos terroristas como a Al-Qaeda. Observei e senti na Florida o fervor patriótico e a euforia da população americana naquele mês de Março.
Nenhum dos pretextos para a invasão do Iraque se confirmou e descobrimos rapidamente que todo o processo de decisão se baseou numa enorme mentira que abalou seriamente os alicerces do mundo democrático.
É verdade que as centenas de milhares de civis mortos e os milhões de desalojados resultantes das invasões do Afeganistão e no Iraque, a descredibilização de regimes democráticos e das instituições internacionais, a institucionalização da mentira e do logro como forma de governo, o clima generalizado de insegurança pública, ocorreram na sequência do 11 de Setembro de 2001.
É também verdade que a invasão militar de países independentes como forma de resolver conflitos internacionais, como recentemente sucedeu na Ucrânia, passou a ser justificada por muitos com base nas invasões posteriores ao 11 de Setembro de 2001.
Mas a responsabilidade por tais ocorrências só marginalmente pode ser atribuída aos que fizeram os aviões chocar com as torres de Nova Iorque.