quinta-feira, 31 de julho de 2014

O Avô de Todos

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Dizem que é de vez à terceira e de facto assim foi. Só ao terceiro soube o que era desfrutar plenamente os primeiros meses da vida de um filho.
O primeiro, o Miguel, concedeu-nos apenas dez dias muito agitados; talvez volte a essa vivência noutra ocasião.
O nascimento da segunda, a Joana, foi-me anunciado por mensagem, no centro de comunicações do velho USS Forrest Sherman, a navegar algures no Mediterrâneo. Foi devidamente festejado em Nápoles, mas apenas com amigos marinheiros americanos. Só a tive no meu colo a partir dos três meses e mesmo assim interrompido por várias ausências no mar, mais ou menos prolongadas.

Notícia do nascimento da Joana
Mas com a terceira, a Catarina, tudo foi diferente.
Vibrei com as primeiras contracções e alegrei-me com a ida para a maternidade na segunda-feira. Enervei-me com a espera na pequena labour room. Invejei as mães que entravam, pariam e saíam, enquanto a João continuava com contrações fortes, mas sem dilatação, hora atrás de hora. Ironizei com o falhanço de todas as técnicas de coaching que aprendi nas aulas de preparação para o parto. Fiquei frustrado com a rejeição das várias tentativas de ajuda, até das massagens com a bola de ténis, porque a João já só queria que a deixassem em paz. Refilei contra a passividade dos médicos americanos, mesmo quando os provocava dizendo que em Portugal as coisas não se passariam assim. Na manhã de quarta-feira, fiquei com o coração apertado quando o monitor mostrou que o batimento cardíaco da bebé estava cada vez mais fraco. Preocupei-me com os preparativos para a cesariana, mas rejubilei quando, de repente, a meio do dia, tudo começou a correr bem: a dilatação completou-se, o batimento cardíaco da bebé normalizou e quase nem sobrou tempo para vestir a farpela para entrar na sala de partos.

A partir desse momento, foi a felicidade pura.
Assisti a um parto lindo. Todo o sofrimento tinha desaparecido do rosto da João. A Catarina nasceu perfeita, de uma brancura extrema. Cortei o cordão umbilical, peguei nela e mostrei-a à mãe. Esperei pelos primeiros testes, pus a primeira fralda e vesti a primeira roupa. Assisti aos primeiros momentos ao peito da mãe. Despedi-me e fui para casa descansar, felicíssimo!

Estava nessa altura no último ano da pós-graduação em engenharia mecânica, a preparar uma tese cheia de “semifusas” e com o título sinistro de “Finite Element Analysis Program (FEAP) for Conduction Heat Transfer”, enchendo e transportando caixas de cartões perfurados para serem engolidos por um ser criado pela IBM que vivia no centro de informática da Naval Postgraduate School em Monterey. Para os interessados em arqueologia, a tese jaz aqui

Claro que com a chegada da Catarina, as prioridades foram redefinidas. À terceira, estava finalmente a viver momentos inesquecíveis.
Acompanhava o esforço da mãe para lhe dar de mamar. Brincava com a João por ter conseguido ser a única a beber cerveja no hospital com receita médica, mas de facto, depois de muitas dores, algumas latas de cerveja e as massagens de uma possante enfermeira, a João conseguiu o que queria: dar de mamar à filha! E com tal sucesso que a Catarina nunca aceitou um biberão de leite, mesmo com fome!
Vivia cada momento dos seus primeiros meses de vida com grande intensidade. E só depois pensava no curso.

Procurei repetir o método com os netos. Julgo que com sucesso porque já me chamaram o avô de todos!

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