Confesso que depois da visita à sede da PIDE/DGS, na António Maria Cardoso, poucos dias depois da ocupação pelas forças do MFA coordenadas pelo meu camarada e amigo Luís Costa Correia, fiquei com pouca vontade de lá voltar. Passados 50 anos, ainda me lembro do que senti ao percorrer aqueles espaços labirínticos e tenebrosos; ao ver as fotografias dos milhares de portugueses cuja vida foi devassada, destruída e reduzida a pastas de papéis, atadas com fitas e arrumadas em prateleiras; ao encontrar a minha ficha, preenchida à mão por mim, quando me matriculei no Técnico em 1968; ao ver os livros e publicações apreendidas e as centenas de revistas pornográficas que encontrava sempre que abria as gavetas das secretárias.
Quando falo da PIDE/DGS aos jovens, para além de relatar a minha fugaz visita ao edifício da António Maria Cardoso e de mostrar a ficha prisional do meu primo Benjamim, uma das 29 510 fichas dos 148 livros de registo de presos da PVDE/PIDE/DGS de 1934 até 18 de Abril de 1974 que a Torre do Tombo colocou online, e onde, ao longo de 9 anos, vários amanuenses registaram a forma como a repressão salazarista destruiu a vida de um jovem de 18 anos, socorro-me depois dos testemunhos de quem tem credibilidade. Desde logo dos testemunhos do Luís Costa Correia sobre os primeiros meses da ocupação da sede da PIDE/DGS como, por exemplo, a “semimória” que publicou em Agosto de 2020.
Relativamente às muitas outras histórias e historietas sobre essa ocupação sou muito cuidadoso. É o caso, por exemplo, da historieta que o comentador de assuntos soviéticos e russos José Milhazes conta no seu livro "Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril - Como a União Soviética não quis a revolução socialista em Portugal", de 2013. Nele relata que um "agente soviético, Guenrikh Borovik," que passando por jornalista em maio de 1974 entra com "facilidade" na sede da PIDE em Lisboa, terá "roubado" o próprio cartão de identidade de Silva Pais, o director da então polícia política, apesar de ter sido revistado pelos militares do Movimento das Forças Armadas que guardavam o edifício.
Acontece que o Bilhete de Identidade de Silva Pais foi depositado pelo Luís Costa Correia no Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra, como se pode confirmar pela consulta ao inventário do espólio que entregou àquela instituição.
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