Facto de viver, de ter vida; existência. Experiência de vida. Processo psicológico consciente no qual o indivíduo adopta uma posição valorizante, sintética, que não é apenas passiva e emocional, pois inclui também uma participação intelectual activa. O conhecimento adquirido através da experiência vivida. Não é lido, não é contado, é experimentado.
sábado, 27 de dezembro de 2025
Mafalda
quinta-feira, 4 de dezembro de 2025
Aníbal Jardim Bettencourt
Agrónomo, Fitopatologista e Geneticista
Introdução e Enquadramento Histórico
Percurso Biográfico e Carreira Institucional em Moçambique (1924–1959)
A Fundação Científica: O Centro de Investigação das Ferrugens do Cafeeiro (CIFC)
A Obra Científica Central: Especialização Fisiológica e Mecanismos de Resistência
O Impacto Global e a Criação de Cultivares de Resistência (Sarchimor e Catimor)
Missões Internacionais e o Eixo Atlântico de Cooperação
• América do Sul: Brasil, Colômbia, Venezuela.[2]
Legado Documental e Conclusão
--------------------------------------------------------------------------------
1. Hemileia vastatrix
Berkeley & Broome - CAPS, https://caps.ceris.purdue.edu/wp-content/uploads/2025/07/Hemileia-vastatrix.pdf
2. Depoimento de Aníbal
Jardim Bettencourt - actd:MOAJB, https://actd.iict.pt/view/actd:MOAJB
3. (PDF) Medicina, ciência e
laboratório A investigação biomédica básica em Lisboa (1880-1950) -
ResearchGate, https://www.researchgate.net/publication/338580781_Medicina_ciencia_e_laboratorio_A_investigacao_biomedica_basica_em_Lisboa_1880-1950
4. Universidade de Lisboa -
Instituto de Ciências Sociais ... - ULisboa, https://repositorio.ulisboa.pt/bitstreams/1ae1fbee-55ba-4dc5-bb24-6ed97c19e22c/download
5. LISBOA GUARDIÃ DE SABER
TROPICAL, https://www.lisboa.pt/fileadmin/informacao/publicacoes/ambiente/lisboa_guardia_saber_tropical.pdf
6. MELHORAMENTO GENÉTICO DO
CAFEEIRO. by JARDIM BETTENCOURT. (Aníbal): Good Soft Cover | Livraria Castro e
Silva - AbeBooks, https://www.abebooks.co.uk/MELHORAMENTO-GEN%C3%89TICO-CAFEEIRO-JARDIM-BETTENCOURT-An%C3%ADbal/30966018542/bd
7. Transferência de genes de
resistência a Hemileia vastatrixdo Híbrido de Timor para a cultivar Villa
Sarchí de Coffea arabica - Instituto Agronômico (IAC), https://www.iac.sp.gov.br/media/publicacoes/iacdoc84.pdf
8. The coffee leaf rust pathogen Hemileia vastatrix: one and a half
centuries around the tropics - PMC - PubMed Central, https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC6638270/
9. Participação da UFV em
pesquisas sobre café é destaque no site da Embrapa, https://www2.dti.ufv.br/noticias/scripts/exibeNoticiaMulti.php?codNot=8138
10. Dezembro 2014 - O Ser
Humano, https://1ajbettencourt.blogs.sapo.pt/2014/09/
* Coffea spp.
é o termo científico para as espécies do género Coffea, que inclui o
cafeeiro, um arbusto da família Rubiaceae cujas sementes (grãos de café), depois de tratados e torrados, são
usadas para fazer a bebida café. O termo "spp." indica que se refere a
múltiplas espécies dentro do género. As espécies comercialmente cultivadas mais
conhecidas são a Coffea arabica (arábica) e a Coffea canephora (robusta).
segunda-feira, 1 de dezembro de 2025
O génio de Saramago na leitura de Diniz Borges
Foi com uma profunda admiração pela lucidez e pela coragem que li a crónica do meu amigo Diniz Borges no jornal Atlântico Expresso, "A Palavra como Responsabilidade: Saramago e Eu". Diniz Borges, ao partilhar a forma como a língua e a diáspora moldaram o seu olhar do mundo, lembra-nos a pertinência do pensamento de José Saramago no complexo tecido político e social que vivemos.
Tal como Diniz Borges, que descobriu Saramago na Califórnia, num Vale de São Joaquim "amplo e queimado de sol", também o meu encontro com o escritor foi marcante. Lembro-me bem, há 45 anos, de uma paragem numa livraria de Lisboa onde um outro meu amigo, o Manuel Begonha, me recomendou um livro de um autor que não conhecia: Levantado do Chão. Gostei de tal maneira que nunca mais me cansei de ler os seus livros e de os recomendar aos amigos. As personagens criadas por Saramago tornaram-se guias morais, desde a visionária Blimunda do Memorial do Convento até ao Cão das Lágrimas do Ensaio sobre a Cegueira.
A força intemporal de Saramago reside na sua capacidade de deslocar os alicerces das nossas certezas. Diniz Borges descreve a escrita de Saramago como "a lucidez de um velho profeta e a irreverência de um homem sem medo de ferir as certezas preguiçosas do mundo". Essa irreverência é, hoje, mais necessária do que nunca, pois as citações de Saramago estão constantemente no meu pensamento: “Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que veem, Cegos que, vendo, não veem”, ou a observação devastadora de que "O tempo das verdades plurais acabou. Vivemos no tempo da mentira universal. Nunca se mentiu tanto, Vivemos na mentira, todos os dias." O mérito de Diniz Borges nesta crónica é traçar as fracturas do mundo que Saramago desvendou e mostrá-las reflectidas nos desafios que enfrentam as democracias actuais.
A crítica de Saramago à cegueira moral ressoa profundamente nas crises políticas. Diniz Borges sublinha que a cegueira descrita no Ensaio sobre a Cegueira não é oftalmológica; é ética. Esta miopia moral leva ao colapso social e civilizacional. Diniz Borges, observando a vida política americana a tornar-se mais polarizada, cínica e indiferente ao sofrimento, volta a Saramago com a pergunta: "como é possível recusarmos tantas vezes ver o que está ali?".
O pânico das instituições face à verdadeira participação democrática, explorado no Ensaio sobre a Lucidez, é outro ponto de contacto capital. Neste romance, o pavor do governo perante um eleitorado que vota em branco leva a uma reacção de “pânico autoritário”. Diniz Borges considera este romance profético num país (como os EUA) onde a supressão de votos, a desinformação e a erosão da confiança cívica ameaçam o próprio fundamento da democracia. Saramago "viu como as democracias se fraturam" e como "as instituições preferem a ordem à justiça, a obediência à compaixão".
Diniz Borges lembra-nos que a obra de Saramago é uma “admoestação”. Ler Saramago hoje é ouvir um aviso sussurrado através do Atlântico: "Cuidado com a cegueira que tomas por conforto. Cuidado com o silêncio a que chamas paz. Cuidado com a indiferença que tomas por normalidade".
Saramago não atacava só o poder; ele “elevava o silêncio à categoria de voz”. Diniz Borges, que cresceu rodeado por trabalhadores agrícolas e operários no Vale Central da Califórnia (e foi trabalhador a tempo parcial e inteiro durante quatro anos), sentiu o "compasso moral de Saramago" como seu.
Com o Memorial do Convento, aprendeu que os humildes e os sonhadores são os verdadeiros arquitetos dos milagres, e que a história é transportada pelas "mãos calejadas dos esquecidos" e não pelos reis. Saramago dignificou o “nome anónimo” — os avós, os trabalhadores, as mães — ao tornar a sua invisibilidade o centro da narrativa, como em Todos os Nomes. A pessoa comum, o imigrante, o trabalhador, o anónimo, nunca é comum, e cada vida merece o espaço narrativo reservado aos reis.
A análise de Diniz Borges ganha uma força inigualável por ser feita a partir da sua experiência como emigrante açoriano nos Estados Unidos da América. Para quem emigra, as palavras tornam-se a "primeira pátria verdadeira". Diniz Borges encontrou em Saramago não apenas um romancista, mas o "Portugal da coragem intelectual", que o formou como adulto, o Portugal da pergunta, do ceticismo e da dignidade.
Diniz Borges sublinha que a diáspora portuguesa, que muitas vezes herda um Portugal de nostalgia, precisa de Saramago para herdar o "Portugal do pensamento, da rebeldia, da profundidade". O nosso património, lembra-nos Diniz Borges inteligentemente, é também intelectual, politicamente consciente e eticamente exigente — uma cultura que "questiona o poder, não que o aceita docilmente".
Diniz Borges conclui que a voz de Saramago regressa hoje "como sino de aviso". Ele não nos elogia; convoca-nos. Convocou Diniz Borges, enquanto membro da classe trabalhadora, e convoca-nos a todos, à memória, à responsabilidade e à solidariedade.
A homenagem mais justa que podemos prestar a Saramago, e que o meu amigo Diniz Borges tão bem realça, é reconhecer que a sua luz não se apagou e que a palavra é, como ele próprio disse, “dever e não ornamento”. A sua crónica é um apelo para voltarmos a ler Saramago, para que o nosso país, a nossa diáspora e a nossa democracia continuem a ver.
terça-feira, 25 de novembro de 2025
A viragem da Revolução portuguesa no tabuleiro da política internacional
| O Presidente Costa Gomes, o Embaixador dos EUA Frank Carlucci, com a mulher Marcia, e o Embaixador da URSS Arnold Kalinin. |
sábado, 25 de outubro de 2025
O 25 de Abril e o separatismo açoriano
Alguns dos meus amigos açorianos, que conheciam bem a História dos Açores e os factores sociais e políticos por detrás do desafio separatista, afirmam que os militares de Abril não conheciam os Açores e, por isso, não terão tomado as melhores decisões. De facto, os militares de Abril, salvo o caso dos açorianos por nascimento ou afinidade, não tinham razões para conhecer melhor os Açores do que qualquer outra região desfavorecida de Portugal. É certo que as ilhas tinham condições geográficas particulares que agravaram as condições socioeconómicas a que o regime do Estado Novo votava tudo o que estava afastado do poder político e económico centralizador, burocrático, arrogante e autoritário, ou seja, de Lisboa e pouco mais. Não era preciso atravessar o Atlântico para conhecer a pobreza, o atraso, as dificuldades de sobrevivência que condenaram milhares e milhares de portugueses à emigração, em condições duríssimas, para as Américas e a Europa.
No meu caso pessoal, pouco sabia sobre os Açores quando ali desembarquei durante o período de actividade mais acesa da FLA. Pouco mais de um mês depois do comunicado que reproduzo, em Novembro de 1975, cheguei a Ponta Delgada como oficial da guarnição da corveta “António Enes”, nomeada para uma comissão de seis meses nos Açores. Era um dos dois primeiros navios da Marinha que iriam permanecer nos Açores por um período prolongado depois dos incidentes de Junho. A "António Enes", comandada pelo então Capitão-tenente Duarte Costa, um oficial íntegro e competente implicado no 25 de Abril, era um navio altamente disciplinado e operacional, e talvez por isso tenha recebido aquela difícil missão.
É desnecessário descrever a hostilidade e as provocações ensaiadas pela minoria independentista, em particular em Ponta Delgada. Mas apesar disso, fomos capazes de cumprir integralmente a nossa missão. Permanecemos em Ponta Delgada nos períodos em que se justificava a nossa presença, sem nunca cedermos às ameaças de várias origens. Navegámos por todo o mar dos Açores, verificámos todos os alertas, em regra falsos, de pesca ilegal, actualizámos o roteiro de todos os fundeadouros como há muito não se fazia, tocámos todas as ilhas, arrostámos com temporais violentos para levar mantimentos e medicamentos a ilhas isoladas, em especial à Graciosa e a S. Jorge, cumprimos tudo o que nos foi exigido ao serviço do povo açoriano. E lembro-me que fomos sempre muito bem recebidos por quem compreendia a nossa missão. Passámos a quadra do Natal na Horta e a população tudo fez para que esquecêssemos a saudade das nossas famílias. Descontado o triste folclore dos apoiantes da FLA, só tive razões para gostar dos Açores e respeitar as suas gentes.
Regressado a Lisboa em Maio de 76, desembarquei para uma missão diferente noutro navio, mas a "António Enes" regressou aos Açores para nova comissão no Verão. Sei que, com outras unidades da Marinha, participou no esforço de transporte de material para construção ou melhoria das infraestruturas aeroportuárias das ilhas mais desfavorecidas. Em Novembro de 1976, regressei ao Açores na “João Roby” para uma nova comissão de seis meses. Cumpri de novo a missão com muito gosto, mesmo quando lutámos contra vagas impressionantes para transportar um doente grave das Flores para a Terceira.
Depois andei pelo mundo e tive oportunidade de conhecer alguma coisa da diáspora portuguesa e, em particular, da originária dos Açores. E apesar das características particulares relacionadas com a cultura e os hábitos de cada uma das regiões de origem, senti-me sempre, como português, profundamente irmanado com todos os açorianos, assim como com todos os madeirenses, transmontanos, beirões, alentejanos, algarvios, etc., que encontrei.
É por isso que sempre relativizei as questões do separatismo, do independentismo ou o que lhe queiram chamar. Para mim a questão fundamental em Portugal não era essa. Era sim a luta contra uma máquina do Estado e um poder económico centralizador, autoritário e burocrático, contrário aos interesses da maioria dos portugueses. E essa sim, foi uma luta que o MFA não teve engenho e arte para vencer.
quinta-feira, 9 de outubro de 2025
Memória de uma casa
| Vista da casa em 1955 (foto colorida) |
| Três gerações da família na casa (1955) |
Nela vivi o meu primeiro ano de vida. Contava a minha mãe que só chorava ao fim do dia, quando o meu avô se atrasava a pegar-me ao colo para me mostrar todos os relógios da casa. Nela brinquei com os meus primos nas breves passagens por Lourenço Marques, determinadas pela atividade profissional do meu pai. Era o porto de abrigo na capital quando o meu pai foi colocado, primeiro, em Inhambane e, depois, em Quelimane. Nela fiz os trabalhos de casa durante o curto período em que frequentei a escola primária Rebelo da Silva, mesmo em frente, do outro lado da avenida. Dela me despedi há sessenta e seis anos, quando a grave doença do meu pai nos trouxe definitivamente para Portugal.
| Vista da casa no Google Maps (2025) |
terça-feira, 16 de setembro de 2025
O Miguel e o Avô Aníbal
− Não sei, meu Amor... o que tu achas?
− Eu acho que sim!
A paixão pela terra, pela natureza, o fascínio por
transformar e construir coisas a partir de tudo e mais alguma coisa, o
interesse no outro e a vontade de cumprimentar estranhos na rua ou no trânsito
parado, herdaste do teu Bisavô.
Sim, Miguel, conheceste o teu Bisavô Aníbal! Tenho a
certeza!
[1] Aníbal
Jardim Bettencourt, nasceu em Lourenço Marques, actual Maputo, Moçambique, em 6
de Junho de 1924. Casado com Maria da Conceição Martins Bettencourt, tiveram
dois filhos, seis netos e doze bisnetos. Faleceu em 16 de Setembro de 2015, em
Cascais, dois dias depois do Miguel nascer.
Saudade
________________
“Perguntava muitas vezes se eramos felizes.
Preocupava-o não o sermos.
Para ele a felicidade nada tinha de supérfluo.
Fazer os outros felizes, respeitá-los e ser fiel eram a sua forma de ser e estar na vida, a fórmula correcta para descobrir a felicidade.
O outro era o lado maravilhoso da vida, da sua vida.
O privilégio foi nosso.
O lado maravilhoso da sua vida fomos nós.
Foi assim que nos fez sentir desde sempre e até ao fim.
E é assim que nos sentimos hoje.
Vivemos com saudade.
Mas celebraremos a vida e a felicidade.
Por ele e por causa dele.”
As palavras são da neta Catarina.
A saudade, essa, é de todos nós.
sexta-feira, 1 de agosto de 2025
Pesar o Sol
Com medeclina e pínulas, a luz a mirar.
No convés, um círculo solar vai projetar,
No limbo inverso, a distância é contada.
"Pesar o Sol", buscar seu ponto zenital,
Quando a alidade pára, em meio-dia exato.
Lê-se o grau preciso, em registo ou em trato,
Para a latitude certa, avanço capital.
Instrumento simplificado, de invenção lusa,
Do astrolábio planar, ao mar adaptado.
Superando o balanço, com engenho provado.
Foi farol na incerteza, rota que se recusa,
A navegar por estima, método limitado,
Traçando o Império, em caminho desvendado.
quarta-feira, 30 de julho de 2025
Do grito ao sonho
No palco de um país que um dia se sonhou,
Chegam vozes de longe, um grito ecoou.
Promessas de pão, de um futuro largo,
Mas o drama se revela, cruel e amargo.
No sítio que labuta, sob o sol a queimar,
Mão-de-obra que a terra insiste em chamar.
Qualificados na alma, com saber e pensar,
Em trabalhos sem rumo, a vida a definhar.
Nos contentores que abrigam, sem lei, sem pudor,
Muitas almas num espaço, de humilhação e dor.
Rendas que disparam, serviços a escassear,
Terra sonhada, a dignidade a roubar.
Redes de engano, com sorrisos de luz,
Retêm passaportes, amarrando à cruz.
Dívidas que sufocam, sem fim à vista,
Ameaças de denúncia, na sombra que insiste.
O medo das autoridades, uma prisão sem grade,
Onde a precariedade é mestre, e a liberdade se evade.
Exploração velada, em cada canto a espreitar,
Um trabalho sem contrato, que pode matar.
Discriminação, um olhar que fere e exclui,
Sobrecarga de horas, a saúde se esvai.
Frustrações e desânimo, no rosto se vê,
Um sonho que se perdeu, sem saber porquê.
Mas a solução não está no que já foi,
Nem no lamento, do que o tempo levou.
É erguer novas estruturas, num futuro a criar,
Onde terra, teto e trabalho sejam para se dar.
Que a economia não mate, mas sim faça viver,
E que a dignidade humana possa florescer.
Dar poder os oprimidos, para ouvir a sua voz,
Porque o sonho comanda a vida, e nos faz caminhar.
sexta-feira, 25 de julho de 2025
Educação, Democracia e Cidadania em Portugal - Uma Análise Crítica
Comparação dos Documentos
1. Reorganização das Dimensões
de Cidadania
- Antigo Modelo (ENEC 2017): A estratégia
antiga organizava os domínios em três grupos com diferentes níveis
de obrigatoriedade.
- 1º Grupo (Obrigatório em todos os níveis e
ciclos): Direitos Humanos, Igualdade de Género, Interculturalidade
(diversidade cultural e religiosa), Desenvolvimento Sustentável, Educação
Ambiental, Saúde (promoção da saúde, saúde pública, alimentação,
exercício físico).
- 2º Grupo (Obrigatório em pelo menos dois ciclos
do ensino básico): Sexualidade (diversidade, direitos, saúde sexual e
reprodutiva), Media, Instituições e participação democrática, Literacia
financeira e educação para o consumo, Segurança rodoviária.
- 3º Grupo (Opcional em qualquer ano de
escolaridade): Empreendedorismo (nas suas vertentes económica e
social), Mundo do Trabalho, Risco, Segurança, Defesa e Paz, Bem-estar
animal, Voluntariado.
- Novo Modelo (ENEC 2025): A nova estratégia
congrega oito Dimensões, organizadas em dois grupos.
- Grupo 1 (Obrigatório em todos os anos de
escolaridade do Ensino Básico e do Ensino Secundário): Direitos
Humanos, Democracia e Instituições Políticas, Desenvolvimento
Sustentável, Literacia Financeira e Empreendedorismo.
- Grupo 2 (Obrigatório no 1.º ciclo do Ensino
Básico, no conjunto dos 2.º e 3.º ciclos do Ensino Básico, e no Ensino
Secundário, cabendo à escola escolher o(s) ano(s) de escolaridade em que
cada uma será desenvolvida): Saúde, Risco e Segurança Rodoviária,
Pluralismo e Diversidade Cultural, Media.
Esta reorganização significa uma clarificação
e um reforço da obrigatoriedade de certas dimensões, que passam a ser
abordadas de forma contínua ao longo de todo o percurso escolar.
2. Alterações e Redefinições
de Dimensões Específicas
2.1. Retirado como Dimensão
Autónoma
- Sexualidade: Esta dimensão, que era
explicitamente listada no 2º Grupo da estratégia antiga, foi retirada
como dimensão autónoma na nova ENEC. A "Educação para a Saúde e a
Sexualidade" na antiga estratégia visava dotar os alunos de
conhecimentos, atitudes e valores para decisões adequadas à sua saúde e
bem-estar, com foco na proteção da saúde e prevenção de risco, nomeadamente
na área da sexualidade.
- Igualdade de Género: Era um domínio
explícito no 1º Grupo da estratégia antiga. Deixou de ser uma dimensão
autónoma na nova ENEC.
- Educação do Consumidor: Presente no 2º Grupo
da estratégia antiga, não aparece como dimensão separada na nova
ENEC.
- Outros Domínios: Domínios do 3º Grupo da
estratégia antiga como "Mundo do Trabalho", "Bem-estar
animal", e "Voluntariado" não são dimensões autónomas
na nova estrutura.
2.2. Conteúdos Integrados e
Aprofundados (mesmo que a dimensão autónoma tenha sido retirada)
- Sexualidade e Educação Sexual (Integração):
Embora não seja uma dimensão autónoma, as Aprendizagens Essenciais (AE) da
nova ENEC integram aspetos relacionados em outras dimensões:
- A dimensão Saúde foca-se na promoção do
"bem-estar físico e mental" e na "proteção contra todas as
formas de violência (incluindo a exploração, o abuso e a
ciberviolência)". No 2.º e 3.º ciclos, é explicitamente mencionada a
necessidade de "Respeitar questões relacionadas com a intimidade e a
privacidade de cada pessoa" e "Estabelecer relações
interpessoais saudáveis, baseadas no respeito, na comunicação, na
confiança e no consentimento".
- A dimensão Direitos Humanos no 3.º ciclo
inclui a análise de casos de "abusos sexuais" e "violência
de género", bem como "violência contra pessoas com orientação
sexual e identidade e expressão de género não normativas".
- Igualdade de Género (Integração): Os
conteúdos são integrados principalmente na dimensão Direitos Humanos,
com aprendizagens como "Reconhecer que meninos e meninas podem
realizar as mesmas atividades e ter as mesmas oportunidades" no 1.º
ciclo, e "Debater a (des)igualdade de género em contextos como a
educação, o trabalho e o exercício de cargos políticos" no 3.º ciclo.
Na dimensão Democracia e Instituições Políticas do Ensino
Secundário, a "desigualdade de género" é abordada como um
desafio atual da democracia.
- Educação Ambiental (Integração): Parece ser
totalmente absorvida pela dimensão Desenvolvimento Sustentável na
nova ENEC, que aborda explicitamente tópicos como a conservação da
biodiversidade e práticas de produção e consumo sustentável.
- Segurança, Defesa e Paz (Integração):
Aspetos da segurança, defesa e paz, que eram um domínio opcional na antiga
estratégia, são agora integrados na dimensão Democracia e Instituições
Políticas da nova ENEC, que prevê o debate sobre o papel internacional
de Portugal, nomeadamente na União Europeia, na co-construção de um mundo
pacífico e livre, e a análise da importância da União Europeia na defesa
da democracia e da paz.
2.3. Destaques e Novas
Abordagens em Dimensões Atuais
- Democracia e Instituições Políticas:
- Maior Obrigatoriedade: Elevada para o Grupo
1, tornando-se obrigatória em todos os anos de escolaridade, o que
representa um aumento significativo face ao modelo anterior onde estava
no 2º Grupo.
- Foco na Ética e Combate à Corrupção: A nova
ENEC introduz explicitamente a temática da ética e integridade na
governança democrática, detalhando a aprendizagem para
"identificar comportamentos de integridade e de corrupção" (1.º
ciclo), "compreender a natureza, incidência e extensão do fenómeno
da corrupção" (2.º ciclo), "compreender as causas e os
múltiplos efeitos da corrupção" (3.º ciclo) e "refletir,
criticamente, sobre o papel dos cidadãos, do Estado e das organizações da
sociedade civil na prevenção e combate à corrupção" (Ensino Secundário).
- Papel Internacional de Portugal e União
Europeia: Maior ênfase no debate sobre o papel internacional de
Portugal e da UE.
- Literacia Financeira e Empreendedorismo:
- Combinação e Maior Obrigatoriedade: Na nova
ENEC, estas duas áreas são combinadas e elevadas para o Grupo 1
(obrigatório em todos os anos). Na anterior, "Literacia financeira e
educação para o consumo" estava no Grupo 2 e
"Empreendedorismo" no Grupo 3.
- Aprofundamento: Foco na tomada de decisões
informadas sobre orçamento, poupança e investimento, e na ética e
responsabilidade social no empreendedorismo.
- Saúde:
- Foco Ampliado: Além da alimentação e
atividade física, a nova dimensão "Saúde" destaca a promoção
da saúde mental e do bem-estar dos jovens, a "proteção contra
todas as formas de violência (incluindo a exploração, o abuso e a
ciberviolência)" e a "prevenção de consumos, comportamentos
aditivos e dependências", bem como os "malefícios do uso
excessivo de ecrãs".
·
Risco e Segurança Rodoviária:
- Combinação: Combina o "Risco" e a
"Segurança Rodoviária" da antiga estratégia (que estavam em
grupos diferentes) numa só dimensão do Grupo 2.
- Abordagem Integrada: Foco na identificação
de perigos, minimização de vulnerabilidades e ações conscientes face a
riscos naturais, tecnológicos e mistos, além da mobilidade segura e
sustentável.
- Media:
- Novos Desafios: A nova ENEC aborda
explicitamente o impacto da Inteligência Artificial na edição e
publicação de conteúdos nas redes sociais, e foca-se na prevenção dos riscos
online como "dependência, cyberbullying, discurso de
ódio, polarização, trolling, sexting, sextorsão". Há um
reforço da ênfase na "utilização crítica e segura das tecnologias
digitais, da informação e dos conteúdos gerados por inteligência
artificial".
- Pluralismo e Diversidade Cultural:
- Nova Designação e Abordagem Detalhada:
Substitui a "Interculturalidade" da antiga estratégia por uma
dimensão mais abrangente no Grupo 2.
- Foco na Discriminação: Inclui a análise de
"diferentes formas de discriminação, como racismo, xenofobia,
anticiganismo, islamofobia, antissemitismo, misoginia, entre
outras". Aborda também os desafios vivenciados por pessoas migrantes
e a proteção dos direitos das minorias.
3. Aprendizagens Essenciais
(AE) e Abordagem Pedagógica
- Acréscimo de Detalhe nas AE: Os novos
documentos, especialmente o "Cidadania e Desenvolvimento -
Aprendizagens Essenciais ", fornecem uma descrição muito mais
detalhada das Aprendizagens Essenciais por ciclo de ensino para cada
dimensão. Isto inclui conhecimentos, capacidades, atitudes e valores, bem
como ações estratégicas de ensino. A estratégia antiga de 2017 listava
apenas os domínios sem o mesmo nível de detalhe nas AE por ciclo.
- Ênfase na Experiência e Atitude Cívica:
Ambas as estratégias enfatizam que a cidadania se aprende através de
processos vivenciais e da participação ativa. A nova ENEC reforça a
importância de os alunos serem autores e terem situações de aprendizagens
significativas.
4.
Operacionalização e Governança da Estratégia
- Estrutura Mantida: A operacionalização
mantém a abordagem transdisciplinar no 1.º ciclo do ensino básico, a
disciplina autónoma nos 2.º e 3.º ciclos, e a componente transversal no
ensino secundário.
·
Maior Detalhe e Clarificação de Papéis
(Novo):
- A nova ENEC especifica que o agrupamento de
escolas/escola não agrupada deve elaborar e aprovar a sua própria
"Estratégia de Educação para a Cidadania da Escola", definindo
os anos para as dimensões do Grupo 2, o modo de trabalho, os projetos com
a comunidade, as parcerias e os critérios de avaliação.
- São claramente definidas as competências do
Conselho Geral (aprovação da estratégia da escola) e do Conselho
Pedagógico (aprovação dos critérios de avaliação).
- O papel e as responsabilidades do Coordenador da
Estratégia de Educação para a Cidadania da Escola são detalhados.
- A avaliação interna das aprendizagens deve ser
contínua, sistemática e com formas de recolha diversificadas.
5. Contexto e Desafios
- Atualização dos Desafios (Novo): A nova ENEC
atualiza a lista de desafios contemporâneos, adicionando explicitamente
"a emergência da inteligência artificial, a saúde mental e o
bem-estar dos jovens, as desigualdades socioeconómicas, a
sustentabilidade, as migrações e a mobilidade internacional". A
estratégia anterior mencionava desafios como sustentabilidade,
interculturalidade, igualdade, e os riscos de fragmentação social,
desinformação e polarização.
Fragilidades Estruturais da Educação para a Cidadania
Antes de prosseguir, quero
expressar a minha opinião de que, enquanto a Educação para a Cidadania for
um edifício com fundações muito frágeis, construído de cima para baixo com
textos oriundos do Ministério da Educação, e a responsabilidade pela Educação
para a Cidadania nas escolas for quase exclusivamente atribuída aos Diretores
de Turma (DT), pouco do que se propõe terá real impacto.
Para que as estratégias sejam
bem-sucedidas, mesmo as bem pensadas com boas intenções, é necessário que a
maioria das escolas tenha vontade ou condições para fazer da Educação para a
Cidadania um projeto multidisciplinar que envolva a direção, professores
de diferentes áreas, assim como especialistas e entidades externas.
No entanto, há escolas que apesar
de tudo continuam a realizar "milagres" na área da Cidadania. A
título de exemplo, refiro os projetos "Semear Abril" e "Abril
Hoje", nos quais participei nos últimos anos, considerando-os muito
gratificantes para mim e, a julgar pelas avaliações, para os alunos.
Análise da Nova Dimensão Democracia e Instituições Políticas
Revistas
as alterações globais que os documentos em consulta pública introduzem na
Educação para a Cidadania, concentrar-me-ei agora na análise crítica do que
é estabelecido, em particular, para a dimensão Democracia e Instituições
Políticas, anteriormente designada Instituições e Participação Democrática.
Em 2018, participei na elaboração
de uma proposta da Associação 25 de Abril à DGE para um referencial do domínio
Instituições e Participação Democrática. Com base nas recomendações do Conselho
da Europa, definimos objetivos para os diferentes níveis de escolaridade. O
nosso propósito era preparar os futuros cidadãos para viver em sociedade,
resolver conflitos, assumir responsabilidades, compreender e aceitar as regras
do Estado de Direito e os mecanismos de representação democrática, e participar
na governação do país.
O referido referencial, que
contou com contributos de outras instituições, só foi divulgado em 2024,
após uma muito longa gestação para uma muito curta vida (um ano). Embora não
tenha cumprido os objetivos nele estabelecidos, irei usá-lo como referência
para a avaliação das Aprendizagens Essenciais (AE) definidas nos novos
documentos para a dimensão Democracia e Instituições Políticas.
Omissões e Modificações Relevantes nos Novos Documentos
Abaixo, apresento um levantamento
do que é retirado ou modificado nos novos documentos da DGE, em
comparação com o referencial de 2024:
- História da Democracia Portuguesa: É
retirada qualquer alusão a factos relevantes da História da democracia e
das instituições democráticas em Portugal. Não é referida nem reconhecida
a importância do 25 de Abril de 1974 na construção da democracia
política em Portugal.
- Conceitos Fundamentais da Democracia: São
omitidos os critérios que permitem identificar as características de uma
democracia, os princípios e os valores em que assenta, assim como a
distinção entre os tipos de democracia (directa, semidirecta,
representativa) e a sua aplicação ao sistema português.
- Poderes do Estado e Órgãos de Soberania: Não
há qualquer referência à importância da separação e interdependência dos
três poderes do Estado – legislativo, executivo e judicial – nem aos
órgãos de soberania que os exercem.
- Sistemas de Governo e Actores Políticos: Não
são identificados e comparados os diferentes tipos de sistemas de governo:
parlamentarismo, presidencialismo, semipresidencialismo. Não é abordado o
papel dos partidos políticos e dos movimentos de cidadãos no exercício do
poder político.
- Funcionamento do Estado Português: Não é
dado a conhecer como funciona o Estado Português, incluindo os princípios
fundamentais da organização do Estado português, o Orçamento do Estado
como instrumento de coesão política e social, e a importância do Orçamento
do Estado na vida dos cidadãos.
- Regiões Autónomas e Comunidades Portuguesas:
Não são referidas as Regiões Autónomas (importância da existência de
órgãos de governo próprio nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira).
Não são referidas a diversidade das comunidades portuguesas fora do
território de Portugal e as suas preocupações.
- Mecanismos de Participação Cívica: Não são
especificadas as formas de participação no processo legislativo (petição,
referendo, iniciativa legislativa de cidadãos), nem outros mecanismos de
participação para além do voto.
- Sistema Eleitoral e Responsabilidade dos Eleitos:
Não é explicado o sistema eleitoral português, a responsabilidade dos
eleitos e os diferentes tipos de eleições.
- Instituições de Defesa de Direitos: Não é
explicitado o papel de instituições como o Provedor de Justiça, Ministério
Público e Tribunais na defesa de direitos, nem a forma de recorrer ou
reclamar junto das instituições públicas.
Novos Focos Introduzidos pelos Documentos
Por outro lado, os documentos em
consulta pública introduzem novos focos, com especial ênfase em:
- Combate à Corrupção: Abordado em todos os
ciclos de ensino, desde a identificação de comportamentos de integridade
(1.º Ciclo) até à reflexão crítica sobre o papel dos cidadãos, do Estado e
da sociedade civil na prevenção e combate (Ensino Secundário).
- Desenvolvimento de Competências de Diálogo:
Valoriza a importância da paz e da não-violência no convívio diário.
- Boa Governança: Salienta a importância dos
valores constitucionais e dos princípios éticos e de integridade para uma
governança democrática.
- Reflexão Crítica sobre Desafios Contemporâneos
da Democracia: Incentiva os alunos a refletir sobre desafios atuais
como o discurso de ódio e a desigualdade de género.
Conclusão Crítica
Em suma, a nova "Estratégia
Nacional de Educação para a Cidadania" e as "Aprendizagens
Essenciais" para a componente curricular de Cidadania e Desenvolvimento representa
uma reestruturação mais coesa e focada, elevando a obrigatoriedade de
dimensões consideradas fulcrais para a cidadania ativa (como a Democracia e
Instituições Políticas), e integrando explicitamente novos desafios sociais
(como a ética e combate à corrupção, a saúde mental e os riscos da inteligência
artificial e online). Paralelamente, os conteúdos de dimensões como a
sexualidade e a igualdade de género são integrados transversalmente em outras
áreas, em vez de terem um estatuto autónomo. A operacionalização é mais
detalhada, com uma clarificação de responsabilidades e uma forte ênfase na
implementação de Aprendizagens Essenciais concretas.
No que concerne às Aprendizagens
Essenciais da dimensão Democracia e Instituições Políticas, omitem os
conceitos históricos da construção da democraticidade de Portugal e a sua
contribuição para o exercício da cidadania na democracia representativa e
participativa consagrada na Constituição da República Portuguesa.
Embora a nova dimensão Democracia
e Instituições Políticas seja elevada para o Grupo 1, tornando-se
obrigatória em todos os anos de escolaridade do Ensino Básico e Secundário,
ela tende a focar-se exclusivamente no atual sistema político, em
detrimento do estudo de outras soluções ou do aprofundamento dos mecanismos de
participação dos cidadãos no governo do país.
Parece-me também haver uma clara
influência dos "novos ventos políticos", em particular do
discurso populista da corrupção. No entanto, estou convencido de que a
corrupção não é a causa principal da fragilidade da Democracia
portuguesa e do afastamento dos portugueses do regime democrático. Outros
factores relevantes para o mau funcionamento do regime democrático como, por
exemplo, o processo eleitoral de escolha dos representantes dos cidadãos, não
são sequer abordados
Podemos encarar a Educação para a Cidadania como a construção de uma casa. Os novos documentos da DGE são como as "plantas" mais recentes para esta casa. Apesar de algumas novidades e reforços (como o combate à corrupção em todos os andares), estas novas plantas removeram importantes pilares históricos do alicerce da casa (como o 25 de Abril e os princípios fundamentais do nosso regime democrático). Além disso, a casa continua a ter "fundações muito frágeis", pois a sua construção depende demasiado de um pequeno grupo de "empreiteiros" (os Diretores de Turma) e de ordens "de cima para baixo". É como tentar modernizar uma casa adicionando novas comodidades, mas, ao mesmo tempo, ignorando ou removendo elementos cruciais da sua estrutura e da sua história, o que pode comprometer a sua solidez a longo prazo.
