Não foi fácil mas finalmente acabei a leitura da Visão
Estratégica para o plano de recuperação económica e social de Portugal
2020-2030 do consultor do Governo, António Costa Silva. Antes de qualquer
outra consideração, devo dizer que se a elaboração do documento foi uma tarefa
cívica desempenhada "pro bono", o esforço merece ser elogiado. Não é
todos os dias que encontramos um cidadão disponível para dar o seu contributo
desinteressado nesta área.
No entanto, como referência estratégica para um plano de
recuperação económica e social do nosso país, o documento fica muito aquém do
que esperava. Repete até à exaustão uma série de ideias e termos mais ou menos
na moda (digitalização, descarbonização, transição energética,
“reindustrialização”, “cluster”, “hub”, “smart” qualquer
coisa, etc.) mas com muito pouco sumo para tantas páginas.
Para só referir dois sectores que conheci bem, o mar e as
indústrias de defesa, não encontrei nada de novo no documento, antes pelo
contrário. O autor parece não ter aprendido nada com o que se passou nos
últimos vinte anos e repete um discurso político que vi ser tragicamente
desmentido pela acção dos responsáveis. Provavelmente será uma coincidência,
mas até o discurso dos “campeões globais” e das empresas tecnológicas maravilha
veio à baila… Se há vinte anos ainda acreditei que fizesse algum sentido, hoje
parece-me patético.
Mas o que menos gostei no documento foi a ligeireza com que
aborda os dois problemas centrais de Portugal: a justiça e a educação. Sobre o
primeiro não chega escrever que “Portugal precisa de uma justiça, em particular
a justiça económica e fiscal, orientada para o século XXI,” e sobre o segundo
não chega dizer que é preciso investir na “requalificação e modernização da
rede de escolas” (onde é que já ouvi isto?) e no “rejuvenescimento do corpo
docente”.
Para quem como eu acredita que as escolas públicas são as
instituições que mais podem contribuir para a democratização da sociedade e
para o combate às desigualdades económicas e sociais, o que o autor escreveu
trouxe-me à memória os versos de Sérgio Godinho:
“E o que é que foi que ele disse?
E o que é que foi que ele disse?
Hoje soube-me a pouco
Hoje soube-me a pouco.”
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