O Jorge Miguel nasceu no final do domingo, dia 3 de Março de 1974. Faria hoje 50 anos.
A jovem mãe, muito combalida por um parto demorado e difícil, sentia a felicidade que todos as mães sentem quando finalmente podem ver o primeiro filho. As marcas dos "ferros" eram bem visíveis na cabeça do bebé, mas estava certa de que iriam desaparecer. Notou a imobilidade das pernas do menino, mas a inexperiência, a delicadeza da médica que decidiu conceder-lhe uma noite de felicidade e a satisfação de olhar o primeiro filho ofuscaram os sinais de que algo estava errado.
No dia seguinte, o mundo desabou quando um médico neurocirurgião entrou no quarto acompanhado de uma enfermeira e lhe explicou que o menino sofria de uma malformação congénita, espinha bífida aberta. A extensão dos danos neurológicos não podia ser avaliada com rigor, mas eram significativos e irreversíveis. O tecido nervoso perdido não podia ser reparado e as funções dos nervos danificados não podiam ser restauradas. E era urgente decidir fazer, ou não, a cirurgia para fechar o defeito e eventualmente impedir a infecção dos tecidos expostos e a morte do bebé.
Foi o primeiro dos dias mais duros da vida da jovem mãe. Com o pai, consultou especialistas, mas depressa percebeu que pouco ajudavam. A decisão teria de ser deles e rápida. E decidiram não operar. O menino foi internado no hospital de Santa Maria por ser o local com melhores condições técnicas para a sua situação. Faleceu com dez dias de vida.
Dez dias em que a mãe do menino, depauperada fisicamente e sujeita a um vendaval de emoções, encontrou a força necessária para o acompanhar, cuidar e mimar com muito amor, até aos últimos minutos de vida. Num ambiente hospitalar desolador, onde faltava tudo menos o esforço e empenho das enfermeiras, a jovem mãe revelou a coragem e a determinação que mais tarde constituíram a trave-mestra de uma maternidade plenamente realizada.
Depois foi preciso voltar a levantar o mundo. Pouco mais de um mês depois foi o 25 de Abril. A seguir a segunda gravidez e a ansiedade da espera, com o pai ausente a navegar nas águas do Atlântico Sul e depois do Mediterrâneo. O nascimento da Joana, quase um ano depois, foi anunciado ao pai por mensagem no centro de comunicações de um navio da Marinha dos EUA. Depois veio a Catarina. E mais tarde um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito netos!
E o oitavo neto é o Miguel Jorge, um sinal de que as contas da vida da mulher coragem estão saldadas e de que muito do que é a nossa família foi construído com o que sentimos e aprendemos nos dez dias de vida do nosso filho Jorge Miguel.
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