Quando partilhei no Facebook o cartaz da exposição
patente no Museu de Marinha sobre a vida do Comandante Carvalho Araújo, as
primeiras reacções, quase simultâneas, foram da sua bisneta Ana Guerreiro e da
minha filha Joana Bettencourt. A Ana já escreveu que apesar de ter nascido 53
anos após a morte do seu bisavô José, sempre sentiu uma forte ligação com ele.
Sei que a Joana, que nasceu pouco mais de 3 anos depois da morte do seu bisavô
José, também sente uma forte ligação com ele.
Provavelmente nem a Ana nem a Joana conhecem os detalhes da
ligação entre os seus bisavôs. O da Joana, então com 20 anos e 2º artilheiro do
Navio da República Portuguesa “Augusto de Castilho”, conheceu o da Ana quando
este, com 37 anos, assumiu o cargo de Comandante do navio em Agosto de 1918, há
quase 100 anos.
Imagino que o 2º Artilheiro José Francisco Martins terá
visto o 1º Tenente José Botelho de Carvalho Araújo entrar a bordo, terá
conversado com outros elementos da guarnição sobre o novo Comandante, terão
eventualmente comentado os rumores sobre o seu estado de saúde; mas estou certo
que a partir daquele momento passou a ser o seu Comandante, aquele a quem devia
total obediência na defesa da Pátria, mesmo com o sacrifício da própria vida.
Já por duas vezes tinha lutado contra submarinos alemães, depois de se ter
apresentado a bordo no último dia de 1917, e tudo indicava que voltaria a ter
que lutar numa outra qualquer missão no mar.
Provavelmente o bisavô da Ana não terá tido oportunidade de
conhecer bem o bisavô da Joana. É certo que ambos tinham as suas raízes em
Trás-os-Montes, mas essa era a única afinidade entre eles. Quando o bisavô da
Joana nasceu na casa da avó materna em Chaves, já o bisavô da Ana tinha
frequentado os preparatórios na Academia Politécnica do Porto e ingressado na
Marinha. E enquanto o bisavô da Joana se fez homem como marçano nas ruas de
Lisboa, o bisavô da Ana cumpriu uma carreira brilhante como oficial da Armada,
foi Deputado por Vila Real à Assembleia Constituinte da República e Governador
do Distrito de Inhambane, em Moçambique.
Mas as circunstâncias históricas e a natureza do serviço na
Marinha fizeram com que partilhassem dois meses das suas vidas a bordo do mesmo
navio. E na madrugada de 14 de Outubro, o bisavô da Joana viveu um dos momentos
mais dramáticos da sua quando testemunhou a morte honrosa do bisavô da Ana, a
poucos metros do seu posto de combate.
Ouvi muitas vezes o bisavô da Joana homenagear a coragem e o
comportamento do bisavô da Ana quando se sacrificou para salvar mais de duas
centenas de passageiros do paquete "San Miguel", na maioria
portugueses dos Açores. Talvez tenha sido essa a razão de um dia ter escolhido
a mesma profissão dos bisavôs da Ana e da Joana e ingressado na Marinha.
E lembrá-lo foi a melhor forma de celebrar o Dia da Marinha,
da Marinha deles e nossa.
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